MANIFESTO PELO CONGELAMENTO DOS ALUGUÉIS EM 2021
2020 foi um ano daqueles. A crise econômica que já assolava nosso país foi agravada pela crise sanitária do coronavírus e o cenário atual é desolador: o desemprego atinge quase 14 milhões de trabalhadores1, a taxa de informalidade no mercado de trabalho é a maior desde 20162, além de milhões de assalariados que tiveram seus contratos de trabalho suspensos, carga horária reduzida e, portanto, sua renda comprometida. Em paralelo com esta situação, o aumento dos itens da cesta básica3 e serviços foi sentido a cada ida ao mercado, ao posto de gasolina, padaria, feiras livres, entre outros lugares que são comuns e essenciais para a nossa sobrevivência, nos colocando em um dilema entre comer e pagar as contas. E tem mais uma despesa que vem aumentando silenciosamente: o aluguel.
Para quem possui um contrato formal de aluguel, o reajuste anual é baseado no índice IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado). Após ter fechado o ano de 2020 em 23,14%, o maior percentual anual desde 2002, o índice continua subindo e em fevereiro de 2021 se encontra na marca de 28,17%4 no acumulado dos últimos 12 meses. Isso significa que um contrato de aluguel no valor de R$1.000, se fizesse aniversário este mês de fevereiro, seria reajustado para R$1.281.
Um aumento deste faz crescer ainda mais os despejos invisíveis, que é como temos chamado os despejos individuais por impossibilidade de pagar o aluguel; seja voluntário, que é quando o inquilino encerra o contrato de locação por não ter expectativa de conseguir arcar com o valor, ou involuntário, quando o inquilino é vítima de uma ordem de despejo por não pagamento.
O que diz a lei e porque não podemos depender dela
Ainda que a gente tenha dispositivos legais aparentemente do nosso lado, como os artigos 317 e 478 do Código Civil, que permitem a revisão de valores de contrato em situações imprevisíveis como é o caso desta pandemia, vimos que tentar negociar com os proprietários nesses termos não funciona. Nós já tentamos negociar nossos aluguéis e também recebemos relatos de outros inquilinos que tentaram. A realidade é que a maioria nem recebeu resposta das imobiliárias ou proprietários, alguns receberam respostas negativas e bem poucos conseguiram redução dos aluguéis e, ainda assim, alguns com a condição de pagar parcelado depois. A segunda opção para quem não conseguiu negociar diretamente com o dono do imóvel seria apelar para uma ação judicial, mas além de ser mais uma solução individualista, é também excludente, visto que muitas pessoas sequer possuem acesso à justiça.
A aposta nessas saídas individuais teve seu preço. Uma grande onda de despejos teve início junto com a pandemia e vimos pessoas tendo que se amontoar em casas de amigos ou parentes, além do crescimento de ocupações com moradias precárias e o aumento da população em situação de rua. Muitos que conseguiram manter o seu teto, tiveram que acumular ainda mais dívidas para isso.
Assim declaramos: não iremos mais confiar na farsa do bom senso do proprietário, tampouco no processo burocrático e moroso do sistema judiciário! A única saída deve ser a luta coletiva!
Este caminho baseado na luta coletiva já se mostrou possível e produtivo nesta pandemia. A campanha Despejo Zero, organizada por dezenas de movimentos sociais e coletivos do Brasil inteiro, possibilitou a resistência organizada ao despejo em muitos lugares do país. Nós, inquilinos, também precisamos nos organizar. Os donos de imóveis e imobiliárias acumulam lucros às custas de nossos aluguéis que lutamos mês a mês para conseguir pagar e muitas vezes nem conseguimos, porque os nossos salários não são suficientes. Portanto o lucro deles está diretamente ligado ao nosso medo de ir parar na rua.
Mas se eles têm dinheiro, nós temos uns aos outros! Só a nossa união e ação coletiva enquanto inquilinos pode bater de frente com o poder dos proprietários. Eles estão organizados e conseguem influenciar as decisões dos políticos. Não é à toa, por exemplo, que metade das doações para a campanha de Bruno Covas, prefeito reeleito em São Paulo, tenha vindo de nomes ligados ao mercado imobiliário5. Sabemos então que o inimigo é forte, mas não temos tempo para temer. Não vamos mais nos endividar para dar lucro aos proprietários, não vamos mais ser despejados silenciosamente um a um. Portanto, convocamos todos os inquilinos para coletivamente lutarmos pelo congelamento do reajuste dos aluguéis em 2021! Nós não podemos e não iremos pagar pela crise!
São Paulo, 19/02/2021.
Coletivo Aluguel em Crise
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